segunda-feira, 7 de dezembro de 2009




Só por Amar diferente

Puxa voocê tem nojo de ver duas mulheres se beijando?
eu tenho nojo de ver gente batendo em gente, de ver gente enganando gente,de ver gente matando gente,de ver gente passando fome, de ver gente negando direiro de gente só por ser diferente,
disso eu tenho um puta nojo!
mas você pode dizer o que pensa da homosexualidade das pessoas...
é saudável falar o que pensa, (desde qe não desrespeite ningém!)
E já que você está tão aberto a discutir esse assunto (o q é louvável da sua parte)
eu te proponho que você tire um pouco o " casaco de moralidade "
e sem idéias prontas imagine como seria se você fosse gay...
não tenho medo. Imagine você se descobrindo ser uma coisa qe não queria (e lembre-se que o mundo não esta preparado pra gente diferente!)
Tente se imaginar sentindo amor por outro ser humano (que infelizmente não é o ser humano do tipo qe sua mãe sonhou),Imagine a dor de ver que você vai ter que escolher entre a sua felicidade ou a dos seus pais... ou então viver escondido e com medo.
levando uma vida frustrada Ai você um dia é descoberto e é humilhado.. negado e escurraçado você está sozinho no mundo !
e não entende por que tem de ser assim.
será que amar é algo assim tão errado?
será que você é tão ruim assim?
quando você abraça seu amigo todo mundo acha fofo, mais se você beija seu amigo você é uma aberração?
Aí começa o preconceito!
você é demitido é xingado na rua por pessoas qe você nem conhece é alvo de piadas e fofocas...
de repente você pensa ser um humano inferior...
só por amar diferente!
pense nisso e tente se imaginar nessa situação cara!
você vai ver qe ninguem merece o seu " nojo "...
vai sentir falta de dignidade e boa vontade.
Pense nisso !

domingo, 29 de novembro de 2009



“ Mais um momento tedioso na minha vida, eu estava sentada no banco da parada de ônibus, no fim de mais um dia de trabalho stressante. Sempre fico bastante desligada nesses lugares, é tudo tão monótono. Chegar, esperar, levantar, entrar, às vezes sentar... E assim por diante. Porém no meio de toda essa rotina, eu resolvi olhar ao meu redor, e me deparei com uma garota linda, tão linda que ofuscava minha vista.

- Meu Deus, como poderia existir no mundo uma pessoa tão linda como ela?

Foi à primeira coisa que passou na minha cabeça.

- Ah. Ela deve ter no mínimo uma namorada ou um namorado, sei lá.

Voltei a olhar pra frente e tentar esquecer, pois sabia que não teria a mínima chance com ela. O engraçado é que ela sentou ao meu lado, soltou um sorrisinho e perguntou as horas, detalhe, eu não estava usando relógio, e isso era bem visível, pois, eu usava uma blusinha sem mangas e minhas mãos estavam em cima da perna. Mas mesmo assim eu a respondi com toda educação possível:

- Desculpa, mas eu não sei te dizer, estou sem relógio. (soltei um leve sorriso)

- Tudo bem, foi apenas uma desculpa para falar com você. Pois percebi que se eu não falasse você não iria nem olhar pra mim. Lara, prazer!

- Você é bastante tímida, não é?

Fiquei completamente vermelha de vergonha, não imaginei que ela pudesse ser tão direta. Juro que fiquei perplexa com a coragem que ela teve de falar, coisa que eu não faria. Às vezes acho que..., às vezes não sempre, que minha timidez é totalmente prejudicial.

- Sophia, o prazer é todo meu. E sim, sou bem tímida, acho que às vezes isso prejudica, principalmente quando quero conhecer alguém que não é nem um pouco “direta” como você. (abri um lindo sorriso, algo que admiro em mim)

Ficamos uns dez minutos conversando, os dez minutos mais rápidos da minha vida por sinal, foi tudo tão maravilhoso e cada palavra que ela dizia iluminava o seu rosto, me deixando cada vez mais apaixonada. Acho que não existem paixões a primeira vista, ou existe? Uma dúvida predominava a minha mente.
Eu passava horas à espera de um ônibus quando estava sem meu carro, e logo no momento que eu mais queria ficar ali sentada, conversando com ela, o ônibus passa. Foi como se eu tivesse que abandonar um amor pra sempre, senti isso ao imaginar que subiria naquele ônibus, mas eu tinha uma esperança imensa que ela me pedisse pra ficar.

- Eu acho que preciso ir agora, a não ser que... Esqueci.

- Acho melhor você ir, esta tarde, mas poderíamos marcar algo não é? Você me faz sentir algo muito bom, queria sair com você essa noite. Pode ser?

Meu Deus, fiquei radiante com esse pedido dela, eu não esperava o momento de chegar em casa tomar um bom banho e sair pra encontrá-la.

Ela me perguntou:
- Posso pegar seu número?
- Pode sim, lógico (...)

Entrei no ônibus, sentei na primeira cadeira que avistei vazia, não conseguia parar de pensar nela. Foi uma viagem tão rápida que quando parei pra perceber já estava na minha parada, desci sorridente e feliz da vida. Ao chegar em casa, como sempre a dificuldade pra encontrar a chave na bolsa, mas nada me incomodava nesse momento.Entrei,joguei as coisas em cima da mesa e corri para tomar banho, depois de todos os rituais de um bom banho fui eufórica a procura de uma roupa linda.

- Vestido preto?

- não, muito básico.

- Huum, que tal uma roupa vermelha? (kkkkkk)

- Acho que nem tenho isso no guarda-roupa.

- Um bom jeans, blusa branca, all star e uma echarpe. ÓTIMO!

Nunca gostei de passar horas escolhendo roupa, sempre achei o básico muito mais elegante, agora na maquiagem, adoro um blush e muito lápis preto. Depois de todos os preparativos fiquei sentada no sofá assistindo... não posso nem dizer o que estava assistindo, pois não lembraria o que se passava na TV, na verdade estava apenas sentada, com a televisão ligada e meus pensamentos voltado a garota dos meus sonhos, minha Lara.
Telefone tocou, poderia dizer que corri apresada pra atender, mas isso nem poderia acontecer, porque o celular estava na minha mão a todo o momento, pra dizer a verdade até quando eu estava a tomar banho ele ficou na mesinha do banheiro. Voltando pra parte que interessa, atendi feliz da vida.

- Oi!

- Olá Sophia, tudo bem?

- Tudo sim, que dizer melhor agora.
(Ouvi seus risos suaves e fiquei ainda mas encantada)

-Eu queria muito ir te buscar, e ai veríamos pra onde ir.

-Ótimo (...)

Uma longa conversa pelo telefone, expliquei-a meu endereço e desliguei. Pulei do sofá, e corri para arrumar melhor a casa, eu no fundo sabia que não tinha o que arrumar, sempre fui bastante perfeccionista, então, nada estaria fora do lugar ou empoeirado. Já que nada estaria fora do lugar eu fui retocar a maquiagem e colocar um pouco mais de perfume. Tudo perfeito, agora só esperar por ela.
Campainha toca, levanto fazendo os últimos retoques e vou logo atender a porta.

- Que bom que você não se perdeu. (soltei um leve sorriso)

- É um pouco longe, mas por você vale à pena.

Essas foram às suas últimas palavras. Sentamos no sofá, seus olhos nos meus, sua boca vinda em direção a minha. O beijo. O beijo tão esperado, tão carinhoso, tão malicioso, tão nosso. Suas mãos não demoraram a percorrer meu corpo, me apertando, me pressionando. Ah... Aquela mão me deu um choque elétrico. Levantei e fiquei a sua frente, não havia música alguma tocando, mas pra mim era como se tivesse música em meus ouvidos, me levando a cada movimento.
Senti-me empurrada, cai de costas no sofá. Outro beijo, as mãos dela percorrendo todo meu corpo, arrancando minha roupa. Tudo tão mágico, em plena sintonia, nunca tinha vivido momento tão perfeito como este. Passamos horas e horas ali, naquele sofá, nos amando como nunca tinha acontecido com nenhuma outra pessoa.

Amanheceu e eu estava deitada ao seu lado, não tinha nada mais bonito do que vê-la dormindo, uma pele macia, suave e branca, seus cabelos pretos e liso estavam completamente assanhados, isso era encantador.
Levantei e fui preparar-lhe um maravilhoso café da manhã. Abri a geladeira e tinha apenas frutas e uma jarra de suco.

- Maças, peras, uvas (...)

- Suco de laranja.

Quando menos esperei, senti ela me abraçar por trás, beijou meu pescoço e desejou-me um bom dia. Que voz mais linda, que sorriso mais belo.

- Eu estava lhe preparando um café da manhã.

- Oh, meu amor. Que lindo, mas eu prefiro que você seja o meu alimento.

Seu sorriso malicioso me enlouqueceu, apesar de que tudo nela me enlouquecia. Então a agarrei e beijei-a e novamente nos amamos, nem melhor ou pior que antes, cada momento era único, especial (...)

Passamos todo o final de semana trancadas no meu apartamento, celulares desligados, avisos na portaria para que não nos incomodassem. Ficamos ali, apenas nos conhecendo e nos amando cada vez mais. Conversamos, brincamos, aprendemos, vivemos a cada segundo que se passava.
Nada era tão perfeito que pudesse durar eternamente, então chegou à segunda-feira, maldita segunda-feira. Eu teria que deixá-la e ir trabalhar, isso era doloroso, queria passar todos os dias da minha vida deitada ao seu lado. Mas, como isso não era possível me despedi dela com um longo beijo e fui trabalhar (...)

Nunca nos separamos mais que o horário de trabalho, tudo tão corrido e cansativo, mas quando lembrávamos que ao voltar pra casa estaríamos uma nos braços da outra tudo era superado. E assim se passou 6 anos, longos e maravilhosos anos.
Cheguei atrasada em casa do trabalho, louca pra encontrar meu amor, minha pequena, minha Lara, desci do carro, peguei algumas sacolas com umas compras e corri para o elevador.

- Que demora se não fosse as compras eu iria de escada.

O elevador chegou, entrei, apertei o botão umas 3 vezes, queria chegar em casa o mais rápido possível. Chegou, toquei a campaninha pois não teria condições de procurar as chaves com as compras na mão. Ela abre a porta, linda como sempre, sorri e me ajuda com as compras, depois de tudo guardado ela me abraça, me beija tão feliz e diz que tem uma noticia maravilhosa pra me dar.

- Amor, estou tão feliz e tenho certeza que você também ficará.

- O que foi? Não me diga que (...). Meus olhos encheram de lágrimas.

- É meu amor, a assistente social veio aqui hoje pela manhã e adorou a nossa casa, disse que a Maria Flor vai ser nossa filha, e que amanhã poderemos buscá-la.

Eu chorei abraçada a mulher da minha vida, chorei de emoção, de alegria, chorei por realizar um sonho, nosso sonho. Agora tinhamos mais certeza que nunca que ela seria nossa filha, nossa tão amada filha.”

sexta-feira, 14 de agosto de 2009





Milonga - Fresno

Vamos falar de solidão
Na sua casa nunca mais entrei
Mas decorei com exatidão
Todas as coisas como eu deixei
Versos jogados pelo chão
Lembranças do que não presenciei
Mas decorei com exatidão
Como o passado que eu mesmo criei

E tudo que eu posso oferecer
São minhas palavras pra você
No plágio de uma bela melodia
E tudo que eu quero te dizer
Eu já cansei de escrever
Quero te ver enquanto não é dia

Mas diz porque tu vais embora
Mas diz porque tens tanto medo
Se não acorda cedo
Nem trabalha, estuda ou namora
Mas diz porque chegou a hora
Agora que eu venci meu medo
Te peguei pelos dedos
Pra dançar enquanto o sol demora
Para chegar trazendo aurora
E a luz que cega e me dá medo
E como um torpedo
Eu deslizo, eu vôo num mar de lençois
E cada dobra conta histórias
De muitas delas sinto medo
São muitos enrredos
Enrolados e embriagados como nós
Tão a sós, como nós, tão a sós

Porque você insiste em dizer que ainda existe vida sem você?
(Quando você não esperar vai doer e eu sei como vai doer e vai passar como passou por mim e fazer com que se sinta assim, como eu sinto)
Porque você insiste em dizer que ainda existe vida sem você?
(Como eu vejo como eu vivo como eu não canso de tentar eu sei que vai ouvir, eu sei que vai lembrar, vai rezar pra esquecer, vai pedir pra esquecer, mas eu não vou deixar, eu não vou deixar)

(Porque você insiste em dizer que ainda existe vida sem você?)
E eu não quero lembrar do que eu fui pra você
Uma simples distração pra você esquecer
Eu não quero lembrar que chegamos ao nosso fim
(Porque você insiste em dizer que ainda existe vida sem você?)
Eu não quero lembrar que eu vou acordar
Sabendo que meus olhos não vão te encontrar
Eu não quero lembrar que tudo acabou pra mim

Vou te esquecer, vou te esquecer
Vou te esquecer, vou te esquecer

Porque você insiste em dizer que ainda existe vida!




-- sem comparações . pode ter ctz qe EU NÃO VOU DEIIXAR ;)

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Explica-me os morangos.


- Explica-me os morangos.
- Os morangos?

(Ela quer que eu lhe explique "os morangos"?)

- Os morangos não se explicam. Quando muito, podem descrever-se. Olha, o mesmo se passa com a saudade. Não se explica. Mas também não se compreende. E também não se descreve, porque cada um sente-a de forma diversa, mas única.

(...)

- Percebeste alguma coisa do que eu disse?

(...)

- Explica-me a saudade.

- Hum... Deixa ver...

(Porque é que ela só faz perguntas difíceis?)

- A saudade é um aperto no peito. É uma aridez. Quando sentes saudade sentes-te só.
- O que é estar só?
- É não ter ninguém com quem falar.
- Então o meu cão está só.
- O teu cão? Porquê?

(!)

- Porque não tem ninguém com quem falar.
- Mas os cães não falam, ladram.
- O meu cão fala. Só que eu não percebo o que ele diz porque não sei falar a língua dele. Quando for mais crescido vou para uma escola aprender. E tu, sabes falar com o meu cão?
- Receio bem que não. Mal consigo comunicar com os homens, quanto mais com os cães!
- Mas tu já és crescida. Não andaste na escola?
- Sim, andei.
- E não sabes falar com o cão?
- Na escola não se aprende língua de cão.
- Como é que sabes?
- Porque sei. Porque não há nenhuma disciplina com esse nome.
- Como é que sabes que não há nenhuma disciplina com esse nome?
- Sei porque quando eu andava a estudar não havia.
- Tens saudades? Da tua escola?
- Tenho... Muitas.
- E das meninas?
- Das meninas também. E dos professores, dos funcionários.
- Não os vês há muito tempo?
- Há imenso tempo. Tanto que já nem sei.
- Não te lembras?
- Não.

(...)

- Então, não me explicas a saudade?
- Explico.

(Explico?!)

- Mas tu disseste que a saudade não se explica.
- Pois disse. Mas vou tentar explicar. Não sei se vou conseguir.
- Ora tenta...
- Está bem. Olha, a saudade é como uma cova na areia. O vento faz covas na areia, não faz?

(Ela confirma que sim com a cabeça.)

- Pois é, mas quem faz a cova da saudade não é o vento, é o tempo. E depois quando nós estamos na praia vamos enchendo as covas de areia com água do mar, não é?

(Novo acentimento.)

- Ora bem... Quando te recordas de uma pessoa com saudade, também enches a cova da saudade, não de água, mas com memórias, compreendes?

(Olha-me atentamente, os olhitos esbugalhados, sorvendo cada palavra minha.)

- Só que por muita água que deites na cova de areia ela nunca fica cheia, pois não?
- Não, porque a água escorrega pelos grãos!
- Exactamente. Com a saudade, também é assim. Tentas não esquecer a pessoa, enchendo a cova com recordações, mas as recordações também se perdem por entre os grãos de tempo...
- E a cova da saudade nunca se enche.
- Pois não. A cova da saudade está sempre aberta, no teu coração. Nunca consegues enchê-la, nunca consegues fechá-la. É como que uma ferida aberta.

(...)

- Bem, espero que tenhas ficado com uma ideia do que é a saudade.
- Hum... Acho que fiquei. Mas posso fazer uma pergunta?
- Sim, claro.
- Porque é que em vez de enchermos a cova com água não enchemos com cimento? Assim o cimento não escorre pela areia e a cova fica fechada para sempre!

(Olhei-o nos olhos, com ternura.)

- Mas é claro que nós também fechamos covas de saudade com cimento! Fazemos sempre que queremos selar uma parte da nossa vida, sempre que queremos colocar uma pedra sobre determinado facto da nossa existência, sobre a lembrança de certa pessoa... Fazemos com grandes pazadas de cimento, energicamente, quanto mais depressa melhor. Nunca me tinha lembrado disso... Mas é totalmente verdade!

A Lua, cinco anos, fez-me compreender o que é a saudade. Obrigou-me a dar explicações, a encontrar uma imagem, um vocabulário, fez-me teorizar.

Às vezes, é bom teorizar sobre as coisas que acontecem na nossa vida. Sabendo explicá-las, a nossa cabeça torna-se aliada do coração, porque deixa de ser só ele a sentir, para passar a ser ele - o coração - a sentir e ela - a cabeça - a entender.

Continuei a passear com a Lua e com o cão. A manhã começou escura, mas lentamente o sol despontou e o final de tarde fez-se agradável, em tons de cor de laranja e lilás. As nuvens continuavam o seu percurso célere, graças ao vento...

- Não vamos ter com os meus pais?
- Sim, claro, vamos que já é tarde.
- Posso fazer só mais uma pergunta?
- Podes.
- Também tens uma cova, não tens?
- Uma cova?
- Sim, de saudade.
- Tenho...

(Bolas, será vidente?)

- Mas... mas... como sabes?
- Hum... é que pareces cansada. Deve ser por estares sempre a tentar enchê-la de água. Estás triste. É por não conseguires tapá-la, não é?
- É.

(Silêncio constrangedor.)

- Olha, deixa lá, não chores por causa disso. Se fechasses essa cova, o tempo ou o vento ou lá o que é abria outra, não era?
- Era, Lua. O vento ou o tempo ou as pegadas dos outros, sei lá!.... Estão sempre a abrir covas no meu coração...
- Eu tenho um balde de brincar na praia. Se quiseres empresto-to para encheres com água.

Obrigada, Lua. Obrigada por quereres ajudar-me. O teu pequeno balde será fundamental, bem como são os teus pequenos olhos atentos, brilhantes, geniais. Obrigada pela lição de hoje.

- Passeamos juntos o cão amanhã?

A Lua abraça-me, dá-me um beijo rápido e desata a correr, ladeado pelo cão, em direcção ao pai.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Ana e Joana



Hoje não me deixaste dormir Joana. De cada vez que fechava os olhos via os teus olhos de anjo, a tua cara sofrida traçada por socalcos de desconsolo e incompreensão. Sempre te levantaste contra as injustiças do mundo, sempre pensaste mais nos outros do que em ti e hoje presto-te singela homenagem querida Joana. Porque este mundo ainda não está preparado para as diferenças intrínsecas que existem dentro de cada um de nós.

A mãe de Joana fechou os olhos logo após a exclamação da enfermeira "é um menino!" e nunca mais os abriu. Durante toda a gravidez tinha sonhado com a sua menina semente que sentia crescer pujante dentro da sua barriga. Muitos anos depois da sua morte pós-parto ainda se comentava que tinha sido o desgosto daquela troca de género que a tinha matado, ou talvez até o desgosto que tinha sentido por pressentir que aquela sua filha nunca poderia vir a ter uma vida fácil e despreocupada. O facto é que Joana se sentia culpada pela morte da mãe que não conhecera. Tudo na vida dela emanava desse “engano” primordial cometido sabe-se lá por quem nem porquê. Tal como sua mãe, Joana estava convencida que deveria ter nascido menina e achou que um pequeníssimo adereço a mais entre as suas pernas não deveria ter a mínima influência naquilo que era a sua essência verdadeira.
A somar à morte da mãe, o pai abandonou-a por achar que aquele filho frágil e doente não iria sobreviver aos anos da infância e entregou-a aos cuidados da avó, que se encarregou de providenciar a educação que sentia necessária à neta, fosse ela menino ou menina. Se Joana sobreviveu foi graças a essa avó, que de tudo fez para que ela se mantivesse à tona num mundo lamaçal pestilento de agressividade e egoísmo. Na escola Joana brincava com as meninas e andava sempre com elas excepto nos momentos em que precisavam de usar a casa de banho. Havia sempre um adulto que se lhe punha no caminho e lhe dizia "Então?? Aí é a casa de banho das meninas, tu não podes entrar aí, tu tens pilinha!" E lá se lembrava que aquele minúsculo adereço lhe impunha rigorosas regras de segregação que todo o resto do seu ser não compreendia. Na aldeia e na escola habituaram-se a chamá-la de Ju, já que ela não respondia quando a tratavam pelo nome de baptismo. João ou Joana, tantas diferenças contidas, escondidas em tão poucas letrinhas. E um preço tão alto a pagar por querer um "n" ali antes do "a" no final. Joana nunca quis o papel de vítima, mas era diferente para todos os que a víamos sempre esmurrada, negra de cotoveladas e pontapés que os miúdos e algumas miúdas se esmeravam em lhe dar. "Que se passa Ju? Fizeram-te mal?" perguntei-lhe muitas vezes. E ela respondia "nada vizinha, não é nada, isto passa!" Ana era uma das poucas meninas que brincavam com Joana. Para Ana não havia dúvidas, Joana era mesmo uma menina como ela, mesmo que soubessem as duas da existência do tal adereço entre as pernas. Foi Ana quem primeiro começou a tratar Ju por Joana e Joana nunca mais reconheceu nenhum outro nome senão aquele apesar de todos os anos que passaram até que pudesse ser seu por direito. Há medida que o tempo passava as meninas tornaram-se mulheres e os meninos homens e Joana ficou ali no meio, parada no tempo, sabendo aquilo que era mas não conseguindo encontrar aceitação no seio daquela gente para aquilo que queria ser. Quando fez 16 anos a avó chamou-a e deu-lhe uma pequena caixa onde tinha guardado todo o dinheiro que tinha conseguido poupar desde o nascimento de Joana. Disse-lhe que o seu tempo tinha chegado ao fim, que não iria durar muito mais, e pediu a Joana para se ir embora dali. Tinha medo do que lhe pudesse acontecer assim que ela não estivesse presente para lhe valer. E assim Joana se foi daquela pequena aldeia onde vivíamos. Partiu para a cidade e mais tarde soubemos que tinha viajado para o Brasil. Só Ana lhe sentiu a falta penso... pelo menos só Ana me disse que sentia a falta daquela menina tão carinhosa, tão sensível, tão prestável e amiga de todos. Um dia passados muitos anos Joana voltou à aldeia mas ninguém a reconheceu. Veio ter comigo e disse-me que se lembrava tão bem de mim, que me preocupara sempre por ela. Demorei algum tempo a rever naquela bela mulher o menino enfezado que dali tinha partido. Explicou-me que no Brasil estavam muito à frente nas cirurgias de mudança de sexo que não sendo um caminho fácil era já possível e com resultados muito positivos. Congratulei-a por ter perseverado nesse seu caminho, abracei-a mesmo, sentindo já um enorme carinho pela mulher feita em que Joana se tinha tornado. Perguntou-me por Ana, queria revê-la e saber se ainda se lembraria dela. Eu sabia que Ana nunca tinha casado, que era uma miúda terrivelmente introspectiva, vivia consigo e para si e raros conheceriam o que lhe passava na alma. Lá lhe indiquei o caminho e vi-a abalar tão segura de si, tão cheia de confiança naquilo que agora tinha para dar. Querida Joana, como me arrependo hoje... devia ter pegado em ti e na Ana e devíamos ter saído logo dali! Ana reconheceu Joana, logo assim que a viu vir. Havia qualquer coisa a ligar essas duas almas, tão transcendental como a vida e o amor. Teve com ela uma conversa que não tinha tido com mais ninguém, talvez estivesse à espera de Joana para descarregar esse fardo que a tinha trazido tão pesada e presa em si mesma. Ana explicou a Joana que um dia já depois dela ter abalado descobriu que não gostava de rapazes. Não suportava que lhe tocassem e muito menos que a beijassem! Dava-lhe asco o seu cheiro a terra, a suor e a álcool. De tal forma que da única vez que um rapaz a tinha tentado beijar Ana tinha soçobrado acometida por fortíssimas náuseas que assustaram o miúdo de tal forma que nunca mais nenhum rapaz quis tentar alguma coisa com ela. Mas Ana sabia que não era frígida, apesar de ser essa a sua fama na aldeia. Só ela sabia os sonhos que povoavam as noites longas e solitárias. Sonhos estranhos esses... feitos de mulheres que a agarravam e a beijavam e aí não havia lugar a pânico de espécie alguma. Ana confessou a Joana que sentia que gostava de mulheres, que seria esse o caminho, não por opção mas porque era esse o seu destino. Mas sentia-se confusa em relação a Joana, porque a idade da razão lhe tinha trazido a consciência do problema da amiga. "Eu sempre te vi como menina, sempre te tratei como menina, sempre te quis, sempre gostei de ti assim..." E Joana explicou-lhe que nos anos volvidos tinha encetado esse longo e doloroso percurso físico que a tinha levado à transformação e reordenação de alguns dos seus órgãos exteriores e interiores. Ao longo dos anos, pouco a pouco, Joana viu emergir em si aquilo que a definia como mulher. E sentia-se mulher, mesmo face ao egoísmo dalgumas útero-fundamentalistas que lhe negavam o direito de se expressar enquanto mulher pelo simples facto de não puder vir a conceber. Sentia-se plena mesmo assim, mesmo sabendo que nunca poderia albergar vida em si. E para mim esse argumento era maldade pura... igual a alguém que insultasse um cego por não poder ver! O caso é que Ana se sentiu atraída por Joana, já antes se tinha sentido, mas não assim, dessa forma tão bruta e latejante. Sentiu um desejo tão profundo por essa mulher, um sentimento tão desesperante de querer nela submergir para sempre. Joana confessou-lhe que também nunca a esquecera, que viera do outro lado do oceano para a procurar e para saber se ela era como as outras ou se a aceitaria tal como era. Estava até disposta a que fossem só amigas, desde que reatassem esse laço que as tinha unido em crianças. Ana aceitou Joana, acolheu-a em si, abraçou-a, beijou-a, lambeu-a, comeu-a... e foi magnífico! Um momento único, feito de Amor, Desejo, Vontade e Sexo. Tudo junto por uma vez só, rodopiando, subindo, explodindo em estrelas de mil cores por cima duma, por cima doutra, renascendo as duas nesse momento, nesse dia em que se amaram e se juraram Amor eterno, para sempre! Queria parar aqui a história, queria deixar as minhas memórias congelar neste preciso momento em que as duas mulheres se amaram como nunca e se sentiram rainhas do mundo e donas duma sabedoria divina. Mas logo após, pouco depois, não sei se foram poucos meses ou muitos, a história ficou manchada de sangue e tristeza. Porque os irmãos de Ana não se conformaram, porque espalharam pela aldeia que Joana era maluca, uma bruxa que tinha sido enviada pelo demónio para destruir a irmã e toda a aldeia. Porque as gentes do campo são crentes no básico e porque se unem em matilhas raivosas para nelas esgotarem as frustrações dos seus dias plenos de mesquinhez e futilidades. Porque o Amor e a Vida não significam nada para essas matilhas que se viram contra os seus! Porque Ana e Joana não previram que a raiva fervia na cabeça e na pele dessas gentes e porque eu própria não as tirei daquele antro antes que os outros as encontrassem e as apedrejassem até à morte. Ana ainda viu Joana desfalecer com a força do embate da pedra bicuda na sua nuca. Ainda tentou estancar o sangue que jorrava do corpo da sua amada, mas sem dedos nem mãos suficientes para travar a vida esvaindo-se em soluços quentes e vermelhos. Ana ainda viu como a turba ululante se atirou a Joana e a retirou dos seus braços, pontapeando e socando o seu corpo moribundo. Depois foi a vez dela mas nesse momento já nada sentia, toda a sua dor se tinha ido juntamente com o ultimo suspiro da mulher que amava. As pedras embatiam-lhe na pele mas por dentro já se congratulava por sentir Joana cada vez mais perto, lá dentro dessa luz que a chamava, lá onde as duas poderiam finalmente viver o Amor que aqui lhes tinha sido negado. Porque as minhas duas meninas ainda estão vivas, tenho a certeza disso. Sinto a luz das suas estrelas, sinto-as por perto nestas noites quentes de verão em que recordo os seus sorrisos e o brilho dos seus olhos nos breves momentos de felicidade que viveram juntas. Tenho pena que a sua luz não brilhe mais intensamente, para dentro da cabeça daqueles que acham que tudo sabem, tudo podem, tudo mandam!